Ela
acabara de assistir ao seminário sobre sua autora preferida. A alma
transbordava de euforia, êxtase. Essa já mencionada felicidade clandestina.
Dirigiu-se à renomada biógrafa com a intenção de um autógrafo. Eis que o
conseguiu. Entrou no elevador e todos os seus pensamentos se elevavam. O
silêncio reverberava dentro dela, fazendo tilintar suas ânsias secretas, seus
sonhos obscuros. Ela voava.
Abraçada
ao livro, caminhou em direção à saída. Lá fora, na calçada, o vento forte a
apanhou de assomo. E num átimo de segundo, desses instantes inusitados e
efêmeros que seguramos pela mão, ela se encheu de tristeza. Ela não sabia
explicar. Ela apenas sentia.
Sentou-se
calmamente no banco da praça. O vento ainda soprava forte. E frio. No céu, as
primeiras estrelas apareciam. Anoitecia. E dentro dela já era noite. Ela se
sentia incomodada. Não era o vento, não era a noite, não era a praça. Certos
descontentamentos lhe inebriavam os sentidos. Ela experimentou um frio lhe
percorrendo o corpo: a espinha, os joelhos, a boca do estômago.
Decidiu
telefonar para ele. Ela pensava em cinema, refrigerante, amor. Essas pequenas
cotidianices lhe prometiam felicidade efêmera. Ela lhe chamou para compartilhar
isto. Ele recusou. Melhor seria manter a distância entre eles. Ele a julgava
nociva. Entregar-lhe a alma, mostrar-lhe bons sentimentos o tornaria
vulnerável, a ela e ao velho relacionamento, já tão maltratado.
Ela
saiu da praça meio perdida, tentando assimilar as duras palavras dele. O som de
buzinas se misturava com o colorido dos faróis e semáforos. O vento balançava
as folhas novas das árvores centenárias. E os pingos de chuva recém caídos do
céu se misturavam com suas lágrimas, brotadas de uma face já abatida.
Segurando
o caderno contra o peito, não ouvia mais os sons angustiantes da cidade. Não
havia velocidade. E tudo se perdia entre esquinas, ônibus e bancas de revistas.
Seus passos se apressaram nas calçadas; era necessário chegar logo. Não se sabia
onde, mas era imprescindível que fosse logo.
Distraída
entre becos e soluços, não ouviu o som familiar, não viu a aflição no rosto dos
transeuntes ao atravessar a rua. Dentro dela, apenas um silêncio paralisante.
Ela finalmente estava livre.